Publicado em 4 de maio de 2017
O episcopado brasileiro,
reunido em Assembleia Geral, em Aparecida (SP), emitiu na tarde desta
quinta-feira, dia 04, Nota Oficial sobre o momento que o Brasil atravessa nos
últimos tempos. Na véspera do encerramento do encontro anual dos bispos, a
presidência da CNBB fez um balanço dos trabalhos e leu a Nota para os
jornalistas.
O Brasil é “um País perplexo diante de agentes públicos e
privados que ignoram a ética e abrem mão dos princípios morais, base
indispensável de uma nação que se queira justa e fraterna”, afirmam os bispos.
E advertem: “Urge retomar o caminho da ética como condição indispensável para
que o Brasil reconstrua seu tecido social. Só assim a sociedade terá condições
de lutar contra seus males mais evidentes: violência contra a pessoa e a vida,
contra a família, tráfico de drogas e outros negócios ilícitos, excessos no uso
da força policial, corrupção, sonegação fiscal, malversação dos bens públicos,
abuso do poder econômico e político, poder discricionário dos meios de
comunicação social, crimes ambientais”.
Leia a Nota na íntegra:
O GRAVE MOMENTO NACIONAL
“Buscai
em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça” (Mt 6,33)
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil–CNBB, por ocasião de
sua 55ª Assembleia Geral, reunida em Aparecida-SP, de 26 de abril a 5 de maio
de 2017, sente-se no dever de, mais uma vez, apresentar à sociedade brasileira
suas reflexões e apreensões diante da delicada conjuntura política, econômica e
social pela qual vem passando o Brasil. Não compete à Igreja apresentar
soluções técnicas para os graves problemas vividos pelo País, mas oferecer ao
povo brasileiro a luz do Evangelho para a edificação de “uma sociedade à medida
do homem, da sua dignidade, da sua vocação” (Bento XVI – Caritas in Veritate,
9).
O que está acontecendo com o Brasil? Um País perplexo diante de
agentes públicos e privados que ignoram a ética e abrem mão dos princípios
morais, base indispensável de uma nação que se queira justa e fraterna. O
desprezo da ética leva a uma relação promíscua entre interesses públicos e
privados, razão primeira dos escândalos da corrupção. Urge, portanto, retomar o
caminho da ética como condição indispensável para que o Brasil reconstrua seu
tecido social. Só assim a sociedade terá condições de lutar contra seus males
mais evidentes: violência contra a pessoa e a vida, contra a família, tráfico
de drogas e outros negócios ilícitos, excessos no uso da força policial,
corrupção, sonegação fiscal, malversação dos bens públicos, abuso do poder
econômico e político, poder discricionário dos meios de comunicação social,
crimes ambientais (cf. Documentos da CNBB 50– Ética, Pessoa e Sociedade – n.
130)
O Estado democrático de direito, reconquistado com intensa
participação popular após o regime de exceção, corre riscos na medida em que
crescem o descrédito e o desencanto com a política e com os Poderes da
República cuja prática tem demonstrado enorme distanciamento das aspirações de
grande parte da população. É preciso construir uma democracia verdadeiramente
participativa. Dessa forma se poderá superar o fisiologismo político que leva a
barganhas sem escrúpulos, com graves consequências para o bem do povo
brasileiro.
É sempre mais necessária uma profunda reforma do sistema
político brasileiro. Com o exercício desfigurado e desacreditado da política,
vem a tentação de ignorar os políticos e os governantes, permitindo-lhes
decidir os destinos do Brasil a seu bel prazer. Desconsiderar os partidos e
desinteressar-se da política favorece a ascensão de “salvadores da pátria” e o
surgimento de regimes autocráticos. Aos políticos não é lícito exercer a
política de outra forma que não seja para a construção do bem comum. Daí, a necessidade
de se abandonar a velha prática do “toma lá, dá cá” como moeda de troca para
atender a interesses privados em prejuízo dos interesses públicos.
Intimamente unida à política, a economia globalizada tem sido um
verdadeiro suplício para a maioria da população brasileira, uma vez que dá
primazia ao mercado, em detrimento da pessoa humana e ao capital em detrimento
do trabalho, quando deveria ser o contrário. Essa economia mata e revela que a
raiz da crise é antropológica, por negar a primazia do ser humano sobre o
capital (cf. Evangelii Gaudium, 53-57). Em nome da retomada do desenvolvimento,
não é justo submeter o Estado ao mercado. Quando é o mercado que governa, o
Estado torna-se fraco e acaba submetido a uma perversa lógica financista.
Recorde-se, com o Papa Francisco, que “o dinheiro é para servir e não para
governar” (Evangelii Gaudium 58).
O desenvolvimento social, critério de legitimação de políticas
econômicas, requer políticas públicas que atendam à população, especialmente a
que se encontra em situação vulnerável. A insuficiência dessas políticas está
entre as causas da exclusão e da violência, que atingem milhões de brasileiros.
São catalisadores de violência: a impunidade; os crescentes conflitos na cidade
e no campo; o desemprego; a desigualdade social; a desconstrução dos direitos
de comunidades tradicionais; a falta de reconhecimento e demarcação dos
territórios indígenas e quilombolas; a degradação ambiental; a criminalização
de movimentos sociais e populares; a situação deplorável do sistema carcerário.
É preocupante, também, a falta de perspectivas de futuro para os jovens.
Igualmente desafiador é o crime organizado, presente em diversos âmbitos da
sociedade.
Nas cidades, atos de violência espalham terror, vitimam as
pessoas e causam danos ao patrimônio público e privado. Ocorridos recentemente,
o massacre de trabalhadores rurais no município de Colniza, no Mato Grosso, e o
ataque ao povo indígena Gamela, em Viana, no Maranhão, são barbáries que
vitimaram os mais pobres. Essas ocorrências exigem imediatas providências das
autoridades competentes na apuração e punição dos responsáveis.
No esforço de superação do grave momento atual, são necessárias
reformas, que se legitimam quando obedecem à lógica do diálogo com toda a
sociedade, com vistas ao bem comum. Do Judiciário, a quem compete garantir o
direito e a justiça para todos, espera-se atuação independente e autônoma, no
estrito cumprimento da lei. Da Mídia espera-se que seja livre, plural e
independente, para que se coloque a serviço da verdade.
Não há futuro para uma sociedade na qual se dissolve a
verdadeira fraternidade. Por isso, urge a construção de um projeto viável de
nação justa, solidária e fraterna. “É necessário procurar uma saída para a
sufocante disputa entre a tese neoliberal e a neoestatista (…). A mera
atualização de velhas categorias de pensamentos, ou o recurso a sofisticadas
técnicas de decisões coletivas, não é suficiente. É necessário buscar caminhos
novos inspirados na mensagem de Cristo” (Papa Francisco – Sessão Plenária da
Pontifícia Academia das Ciências Sociais – 24 de abril de 2017).
O povo brasileiro tem coragem, fé e esperança. Está em suas mãos
defender a dignidade e a liberdade, promover uma cultura de paz para todos,
lutar pela justiça e pela causa dos oprimidos e fazer do Brasil uma nação
respeitada.
A CNBB está sempre à disposição para colaborar na busca de
soluções para o grave momento que vivemos e conclama os católicos e as pessoas
de boa vontade a participarem, consciente e ativamente, na construção do Brasil
que queremos.
No Ano Nacional Mariano, confiamos o povo brasileiro, com suas
angústias, anseios e esperanças, ao coração de Nossa Senhora Aparecida,
Padroeira do Brasil. Deus nos abençoe!
Aparecida
– SP, 3 de maio de 2017.
Cardeal Sergio da Rocha
Arcebispo de Brasília
Presidente da CNBB
Arcebispo de Brasília
Presidente da CNBB
Dom Murilo Sebastião Ramos Krieger, SCJ
Arcebispo de São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB
Arcebispo de São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB