Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA, 29 Mai
(Reuters) - O senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) se disse vítima de
"conspiração", em depoimento nesta terça-feira ao Conselho de Ética,
e admitiu relação de "amizade" com Carlinhos Cachoeira, acusado de
comandar uma rede de jogos ilegais.
Demóstenes apresentou
sua defesa no processo por quebra de decoro parlamentar, no qual é alvo
acusações de que teria usado seu mandato e suas relações para atuar em favor de
Cachoeira, preso desde fevereiro.
O senador se disse
vítima de uma "conspiração" de policiais federais e de integrantes do
Ministério Público para "pegar um parlamentar e destruí-lo, criar um
Estado policialesco". As acusações contra Demóstenes, que levaram o
parlamentar a pedir no início de abril sua desfiliação do DEM, surgiram a
partir de interceptações telefônicas da Polícia Federal.
O senador negou,
durante o depoimento que durou pouco mais de cinco horas, que tenha relação com
jogos ilegais, mas admitiu que mantinha uma amizade com Cachoeira.
"Eu jamais tive
qualquer participação em esquema de jogos ilegais", afirmou.
"Reafirmo que tinha amizade com ele (Cachoeira)", declarou
Demóstenes, ressaltando que Cachoeira tinha muitas relações sociais e mantinha
diálogos "com cinco governadores". Ao ser perguntado quais seriam, ele
não quis responder.
Segundo o senador,
Cachoeira teria garantido que trabalhava como empresário e que já não praticava
atividade que pudesse ser considerada contravenção.
"O que ele disse a
mim, disse também a outras pessoas, que não lidava mais com jogos",
afirmou o senador aos colegas, que devem votar no fim de junho um relatório que
pode recomendar sua cassação. Uma vez aprovado no Conselho de Ética, o
relatório ainda será submetido a voto secreto no plenário do Senado.
O senador Humberto
Costa (PT-PE), relator do processo no conselho, considerou as mais de cinco
horas de depoimento "enriquecedoras".
Demóstenes afirmou
ainda que chegou a pensar em renunciar ao seu mandato e que vive um momento que
eu jamais esperaria passar.
"A partir de 29 de
fevereiro deste ano, eu passei a enfrentar algo que nunca tinha enfrentando em
minha vida: depressão, remédio para dormir e que não faz efeito, fuga dos
amigos e talvez a campanha sistemática mais orquestrada da história do
Brasil", afirmou no início de sua defesa.
"Pensei nas piores
coisas, pensei em renunciar ao meu mandato", acrescentou.
CRÍTICAS A GURGEL
Demóstenes dirigiu
críticas ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e questionou a
decisão do procurador de não apresentar denúncia em 2009, quando recebeu
informações da operação Vegas, realizada pela Polícia Federal.
"Ele prevaricou...
Prevaricação exige o elemento que é para satisfazer sentimento ou interesse
pessoal. Mas em relação à improbidade administrativa, é evidente", disse
Demóstenes, argumentando que Gurgel deveria ter tomado alguma atitude como
arquivar ou denunciar o caso ao foro competente.
"Mais dia, menos
dia, ele vai ter que explicar por que fez dessa forma", acrescentou.
Sobre os procedimentos
que tomou em relação ao caso, Gurgel respondeu por escrito à CPI mista que
investiga as ligações de Cachoeira com políticos e empresário, que não havia
indícios para acionar o Supremo à época.
O procurador afirmou,
no entanto, que considerou as informações da operação "promissoras",
e adotou a estratégia de não acionar o Supremo naquele momento o que, segundo
ele, levou à Operação Monte Carlo, da PF, que resultou na prisão de Cachoeira.
"JOGANDO
VERDE"
Em resposta a denúncias
de que teria passado a Cachoeira informações de reuniões reservadas com
autoridades do Executivo, Judiciário e Legislativo, Demóstenes afirmou que
estava "jogando verde", para checar se o amigo tinha envolvimento com
jogos ilegais.
"O único propósito
era para saber se ele realmente estava no jogo", justificou.
O senador também negou
ter atuado como "lobista" da descriminalização dos jogos.
"Jamais fiz isso", disse. "Que lobista sou eu que nunca procurou
nenhum colega senador para legalizar jogo?", questionou.
TELEFONE DE CACHOEIRA
Pesam ainda contra
Demóstenes denúncias de que teria utilizado um aparelho de telefone/rádio
oferecido e pago por Cachoeira. O telefone, habilitado nos Estados Unidos,
seria protegido contra interceptações telefônicas.
O senador argumentou
ter aceitado o telefone por "comodidade" e que usava o aparelho para
se comunicar com "várias pessoas". "Eu não tinha como adivinhar
que isso era utilizado para outras finalidades."
Demóstenes negou ainda
ter recebido a informação de que o telefone não poderia ser grampeado e recebeu
críticas de seus colegas.
"Como pode um
senador da República ter qualquer coisa doada por qualquer cidadão? Quanto mais
um cidadão que era um contraventor, de conhecimento público?", questionou
o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP).
No início de seu
depoimento, o senador utilizou a tese de sua defesa, que critica toda a
investigação sobre o envolvimento entre Demóstenes e Cachoeira. Seus advogados
argumentam que a investigação e coleta de provas tinha de ser autorizada pelo
STF, uma vez que o senador tem foro privilegiado.
Embora critique a
validade das gravações, Demóstenes utilizou algumas delas para exemplicar o que
acredita ser uma descontextualização dos diálogos.
Humberto Costa afirmou
que com esse precedente, também pode utilizar as interceptações. "Ele usou
vários trechos de degravações da Polícia Federal, o que também me dá a
liberdade de usá-los ao longo do relatório", disse a jornalistas. Segundo
Costa, em cerca de três semanas deve concluir seu parecer.
Demóstenes também é
alvo de inquérito aberto em março pelo STF, que solicitou a quebra do sigilo
bancário do senador por suas ligações com Cachoeira.
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Reuters 2011
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