Após a decisão do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região (TRF5) de anular as 13 questões vazadas do Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem) somente para os 639 alunos do Colégio Christus,
de Fortaleza (CE), o Ministério da Educação (MEC) divulgou nesta sexta-feira
uma nota técnica que subsidiou o entendimento do desembargador Paulo Roberto de
Oliveira Lima, presidente do TRF5.
Na nota, professores explicam a
Teoria de Resposta ao Item (TRI) e, considerando o caso das 14 questões do Enem
2011 que foram vazadas em Fortaleza, analisaram três soluções possíveis para o
problema. A primeira sinalizando para a reaplicação do exame somente para os
estudantes do Colégio Christus; a segunda visando ao cancelamento das 14
questões para todos os candidatos do País; e a terceira restringindo a anulação
aos estudantes do Christus.
O documento aponta que a anulação
das questões vazadas apenas para os alunos da escola do Ceará é
"tecnicamente a solução mais adequada e que garante a maior isonomia para
os participantes do Enem". A nota é assinada pelo ex-presidente do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Reynaldo
Fernandes, professor da Universidade de São Paulo (USP), e pelos professores
José Francisco Soares, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Tufi
Machado Soares, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Ruben Klein,
da Fundação Cesgranrio.
Confira a nota na íntegra:
"A Teoria de Resposta ao
Item (TRI) é um conjunto de modelos matemáticos que considera o item como
unidade básica de análise e postula que o desempenho de um avaliado em um teste
pode ser predito (ou explicado) pela proficiência (habilidade) e pelas
características dos itens do teste. A TRI modela a probabilidade de um
indivíduo responder corretamente a um item como função dos parâmetros do item e
da proficiência (habilidade) do respondente. Essa relação é expressa por meio
de uma função monotônica crescente que indica que quanto maior a proficiência
do avaliado, maior será a sua probabilidade de acertar o item (ver, por
exemplo, Andrade & cols, 2000; Baker & Kim, 2004; Hambleton & cols,
1991; Klein, 2003; Pasquali, 1997).
No Enem, o modelo matemático
utilizado é o logístico de três parâmetros desenvolvido por Birbaum (1968). De
acordo com esse modelo, três características do item são consideradas para
cálculo da proficiência do aluno: poder de discriminação (parâmetro a),
dificuldade (parâmetro b) e a probabilidade de acerto ao acaso (parâmetro c).
Proficiências estimadas a partir de subconjuntos de itens na mesma escala
poderão ser comparadas, independentemente dos itens e do número de itens
utilizados para o cálculo.
A teoria pressupõe que um
participante situado em certo nível de proficiência tende a acertar os itens de
nível de dificuldade menor que sua proficiência (itens mais fáceis) e errar os
itens de nível de dificuldade maior (itens mais difíceis). Ou seja, o padrão de
resposta do participante é considerado no cálculo da proficiência. Isso se deve
ao fato de que no modelo logístico de três parâmetros da TRI, o cálculo da
proficiência não está relacionado somente ao número de acertos, mas também aos
parâmetros dos itens e a coerência das respostas.
Certamente, a quantidade de itens
acertados influencia na estimação da proficiência, mas pessoas com o mesmo número
de acertos podem ter proficiências diferentes e uma pessoa pode ter uma
proficiência maior que uma outra com um maior número de acertos, dependendo das
características dos itens acertados, incluindo sua dificuldade, e do padrão de
respostas do candidato. O cálculo da proficiência é objetivo, e estudantes com
exatamente o mesmo padrão de respostas apresentam as mesmas proficiências.
Deve ficar claro que isso não
significa dizer que o número de itens em um teste não interfere no cálculo das
proficiências. Em toda avaliação, quanto mais informação, maior será a
precisão. Como os itens são a fonte de informação do teste, quanto mais itens,
mais precisão. Todavia, de modo geral, variações pequenas no número de itens de
um teste tendem a ter pequenas interferências nas estimações das proficiências.
No Enem, para cada aluno, são
calculadas quatro proficiências, uma para cada área de conhecimento. Cada
proficiência é baseada em 45 itens. Considerando o caso das 14 questões que
foram de conhecimento antecipado dos estudantes do Colégio Christus, três
soluções técnicas foram levantadas:
(1)Reaplicação do exame somente
para os estudantes do Colégio Christus. Essa é a medida que o Inep adotou para
resgatar a isonomia quando o participante prejudicado não tenha responsabilidade
sobre o ocorrido. Como a TRI permite que as notas de alunos submetidos a provas
distintas possam ser comparadas, essa medida eliminaria a alegada vantagem
desses estudantes por já terem se defrontado com parte das questões do exame em
simulado realizado pela escola. No entanto, uma nova prova em data posterior
não está isenta de questionamentos. Alegando favorecimento dos estudantes do
Colégio Christus, pode-se argumentar que os mesmos teriam 30 dias a mais de
estudo, o que poderia trazer algum tipo de privilégio. Alegando
desfavorecimento, pode-se advogar que uma nova prova poderia prejudicar esses
estudantes em outros vestibulares, seja porque a nova data pode coincidir com
outros vestibulares seja por aumentar ainda mais a pressão a que esses
estudantes estão submetidos.
(2)Anulação das 14 questões
(quatro em ciências humanas, cinco em ciências da natureza, uma em linguagens e
códigos e quatro em matemática) para todos os participantes do Enem. Nesse
caso, a igualdade de condições, em relação ao ineditismo das questões, estaria
restabelecida. O custo dessa medida é o de reduzir a precisão da medida de
proficiência para todos os participantes do exame. Ainda que essa perda de
precisão seja pequena, não parece razoável adotá-la para aproximadamente 4
milhões de participantes quando apenas cerca de 600 estudantes já haviam se
defrontado com essas questões previamente. Vale ressaltar que, do ponto de
vista da medida, o ideal para um exame como o Enem seria o de ordenar seus
participantes de acordo com suas ¿verdadeiras¿ proficiências. Assim, obter
estimativas mais precisas possíveis dessas proficiências constitui-se um dos
principais objetivos. Foi justamente por isso que a TRI foi introduzida e a
prova é relativamente extensa. A anulação das 14 questões para todos os
participantes pode ser injusta.
(3)Anulação das 14 questões
somente para os estudantes do Colégio Christus. A estimação da proficiência em
uma mesma escala, para cada área, pode ser realizada mesmo com número diferente
de questões entre as provas, assim, a anulação de 14 questões somente para os
estudantes do Colégio Christus continuará permitindo a comparabilidade. Na
análise, pressupõe-se que essas questões não foram apresentadas aos estudantes
do Christus, portanto, para os cálculos das proficiências serão consideradas 41
questões em ciências humanas, 40 em ciências da natureza, 44 em linguagens e
códigos e 41 em matemática. A Teoria Clássica dos Testes (percentual de acerto)
já permitiria que essa solução fosse a mais indicada em caso de um grupo tão
reduzido de participantes do universo avaliado ter tido acesso anteriormente a
um pequeno número de questões (14 em 180). A TRI é ainda mais adequada para
avaliar provas com número de itens diferentes, uma vez que o cálculo das
proficiências é realizado considerando o padrão de respostas em relação ao
itens apresentados. Essa medida não afeta e permite uma melhor precisão para os
outros 4 milhões de participantes do Enem 2011 e as proficiências obtidas com
um número menor de questões estarão circunscritas a um número diminuto de
alunos.
Dessa forma, avalia-se que
tecnicamente a solução mais adequada e que garante a maior isonomia para os
participantes do Enem é a anulação das questões somente para os estudantes do
Colégio Christus."
http://www.jb.com.br/pais/noticias
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