Após dois dias de julgamento, ministros decidiram que órgão pode continuar abrindo investigações independentemente das corregedorias dos tribunais locais; STF analisou ação proposta pela Associação dos Magistrados
Mirella D'Elia e Gabriel Castro
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O relator da ação, Marco Aurélio Mello, ironiza: "O CNJ tudo pode" (Nelson Jr./STF) |
O Supremo Tribunal Federal (STF)
assegurou nesta quinta-feira a autonomia do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
para abrir investigações e punir juízes suspeitos de irregularidades. A decisão
foi tomada após dois dias de julgamento. Os ministros analisaram uma Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI), proposta pela Associação dos Magistrados
Brasileiros (AMB), que questionava os poderes do conselho, fixados por uma
resolução interna.
Como se esperava, o placar foi
apertado. Dos onze ministros, seis votaram a favor da atuação
"primária" e "concorrente" do CNJ, ou seja, que ele possa,
como hoje, abrir investigações independentemente das corregedorias dos
tribunais. Foram eles: Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes,
José Antonio Dias Toffoli, Carmén Lúcia e Rosa Weber.
Os outros cinco ministros votaram
pela atuação "subsidiária" do conselho, em outras palavras, que ele
só possa agir em caso de falhas das corregedorias. Foram eles: o relator, Marco
Aurélio Mello, o presidente, Cezar Peluso, o decano (ministro mais antigo)
Celso de Mello e os ministros Ricardo Lewandowski e Luiz Fux.
O posicionamento da maioria dos
magistrados já era amplamente conhecido. O voto crucial para decidir a questão
foi o da novata Rosa Weber, que fez sua estreia no plenário do Supremo. "A
iniciativa do CNJ independe de motivação expressa, sob pena de, na origem, eu
estar a retirar a finalidade do controle a ele conferido", disse. "O CNJ
pode sim, tem competência primária para exercer o controle administrativo e
disciplinar".
Debate - O debate, que divide
opiniões no Judiciário, pôs as duas correntes em lados opostos também no
plenário do Supremo. De um lado, o relator, Marco Aurélio Mello, puxou a corrente
dos magistrados que acreditam que o CNJ extrapola suas atribuições. Marco
Aurélio chegou a dizer, durante o julgamento, que o conselho "tudo
pode".
Foi seguido de forma enfática por
Luiz Fux, que usou números para justificar seus argumentos. Segundo ele, o CNJ
analisa apenas 10% dos processos administrativos contra juízes que chegam ao
órgão e devolve 90% às corregedorias dos tribunais. "Ele, então, pode
escolher a reclamação que vai julgar a bel prazer? Será que é um
superórgão?", indagou Marco Aurélio.
A este grupo juntaram-se, também,
as alegações de que o conselho só pode tocar investigações em situações
"anômalas" ou "excepcionais". Ou seja, pode agir apenas com
justificada motivação, em caso de falha das corregedorias, sob pena de esvaziar
a atuação dos órgãos que atuam nos estados. "O exercício da competência do
conselho não pode prejudicar a competência dos tribunais", afirmou o
presidente Cezar Peluso, o último a votar, já na noite desta quinta. "Não
é isso que a Constituição diz e meu compromisso é com a Constituição".
Transparência - No início da
tarde, os ministros decidiram que devem ser públicas as sessões de julgamento
de processos contra juízes suspeitos de irregularidades. Iniciado na
quarta-feira, o julgamento foi retomado às 14h50 desta quinta. Entre os pontos
discutidos nesta quinta destacaram-se os artigos 4º e 20 da resolução 135 - que
determinam que os julgamentos de processos administrativos contra magistrados
devem ser públicos.
A AMB questionava a publicidade
das sessões. Os ministros optaram pela transparência. “Nenhuma autoridade pode
temer o escrutínio público”, disse o ministro Celso de Mello. “A cultura do
biombo, graças a Deus, foi superada e substituída pela cultura da
transparência”, afirmou Carlos Ayres Britto. “Nas coisas publicas o melhor
desinfetante é a luz do Sol”
O STF analisou ponto a ponto da
resolução 135 do CNJ, que define as atribuições do conselho e trata de punições
a magistrados. O desmembramento tornou a votação longa e complexa. Entre outros
itens analisados, os ministros também decidiram, nesta quinta, que o conselho
não pode impor deveres às corregedorias dos tribunais. A questão mais delicada
do debate - se o CNJ pode continuar investigando magistrados independentemente
da atuação das corregedorias dos tribunais locais - foi a útlima a entrar em
pauta.
Na semana que vem, o tribunal
voltará a se debruçar sobre o imbróglio. Ainda terá de analisar alguns pontos
da liminar concedida por Marco Aurélio no fim do ano passado a pedido da AMB.
Repercussão - Após a sessão, o
vice-presidente da AMB, Raduan Miguel Filho, comentou o resultado:
"Estamos vencidos, mas não convencidos", disse. "Essa decisão
pode dar ensejo a que as corregedorias possam atuar c om mais celeridade. Isso
é um reflexo natural. Mas isso vai trazer um abarrotamento de carga laboral ao
CNJ".
O advogado da entidade, Alberto
Pavie, afirmou que a decisão cria uma zona de incerteza em que o corregedor
deixa de ser obrigado a levar adiante investigações sobre irregularidades em
seu tribunal. "As corregedorias ficarão sob um regime de absoluta
discricionaridade. Onde houver um corregedor influente, ele nada poderá
fazer", declarou.
Já a Ordem dos Advogados do
Brasil comemorou: "O STF zelou pela Constituição. Essa decisão faz
renascer o CNJ", disse o presidente da OAB, Ophir Cavalcante.
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