domingo, 12 de fevereiro de 2012

O agir de Jesus vai além do bem físico



As elites religiosas de Israel, que assumiram o poder político após o fim da realeza da dinastia davídica, elaboraram inúmeros preceitos legais, que foram atribuídos a Moisés, apresentado na tradição como o grande legislador. Com isto sobrecarregavam e oprimiam o povo humilde e simples com centenas de exigências de observâncias, de difícil cumprimento para este povo, o que levava a que muitos fossem humilhados com a qualificação de impuros e pecadores. Assim, por exemplo, era considerado impuro aquele que tocasse em um animal doméstico morto (Lv 5,1-6) ou comesse sem antes lavar as mãos (Mt 7,3 - "tradição dos antigos"), o que poderia acontecer com frequência entre camponeses ou empobrecidos, em contato com criações e em situações de carência de água. Quem se tornasse impuro deveria levar ao sacerdote uma fêmea de gado miúdo para ele fazer o rito de expiação, que o livraria do pecado. A mulher com fluxo de sangue era considerada impura e, depois dos dias de suas regras, deveria levar ao sacerdote duas rolas ou dois pombinhos, o qual os oferecia como sacrifício pelo pecado (Lv 15,19). Até os doentes eram considerados impuros e pecadores, o que os levava à exclusão do convívio com os considerados "puros" e "justos". Na narrativa de hoje, o que constrange o leproso é a sua qualificação religiosa de impuro e, portanto, pecador, com a sua consequente exclusão. Deve morar a sós, fora da cidade, e apresentar-se com roupas rasgadas e aparência descuidada, de maneira repugnante, proclamando sua impureza (primeira leitura).
Esta narrativa do evangelho de Marcos revela que o empenho de Jesus não é a simples cura, mas a inclusão social dos marginalizados. O agir de Jesus vai além do proporcionar a recuperação do bem físico particular daquele homem. O seu objetivo maior é promover a inserção plena dos excluídos em um convívio social fraterno e justo, fundamental para uma vida saudável. Jesus vem para libertar todos os oprimidos pelo sistema religioso, centrado no Templo de Jerusalém, com seus códigos de pureza e impureza. Esta libertação passa pela consciência que ele quer despertar nos excluídos de que a sua situação de exclusão é fruto de uma injustiça sociorreligiosa e que esta não é a vontade de Deus. A imposição de silêncio de Jesus ao homem purificado pode ser entendida como tentativa de evitar que fosse visto como um simples taumaturgo resolvendo problemas individuais e imediatos das pessoas. O seu envio ao sacerdote será um testemunho da ação libertadora e vivificante de Jesus. Tendo tocado no leproso, Jesus passa a ser visto como um impuro também, por isso evita entrar nas cidades. Contudo, o gesto de Jesus revela também a sua indiferença diante do preceito legal. E, ainda mais, há uma inversão de valores: ao invés de Jesus contagiar-se é o leproso que fica purificado. Isto significa uma subversão da ordem constituída: o sistema que exclui os impuros e pecadores é abolido pela nova prática amorosa de Jesus que acolhe a todos, sem discriminações (segunda leitura).

José Raimundo Oliva

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