segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Assim caminham Lula e Dilma, para deixar Zé Dirceu pela estrada

 
Antes do isolamento, ambos, como quem se despedem dos petistas mensaleiros, providenciaram campanha para garantir prisão com conforto ao “ex-capitão do time”
Petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares são condenados pelo Supremo Tribunal Federal, mas, como sempre, Lula da Silva não viu
A.C. Scartezini
“Não vi”, respondeu Lu­la secamente quan­do perguntaram como viu a condenação dos companheiros Zé Dir­ceu, José Genoino e Delúbio Soares pelo Supremo Tribunal Federal. Não viu, nem quer ver e escondeu-se durante toda a se­mana. Lula gostaria muito que os três o esquecessem, assim como não procuram a presidente Dil­ma Rousseff porque seriam ignorados, nem ousam passar pelo Planalto.

A distância de Lula e Dilma em relação aos três mensaleiros condenados é um esforço para não contaminar a imagem de seus governos. Mas, no caso da presidente ela sempre esteve distante de Dirceu. Coisa de incompatibilidade de gênios. Em relação ao ex, quando se tornou inevitável o início do julgamento em agosto. Delúbio e Genoino ficaram cada um quieto em seu canto, mas Dirceu foi agressivo enviou recados constantes como quem pede socorro.

A primeira investida de Dirceu ocorreu logo no começo de agosto, quando advogados do antigo chefe da Casa Civil de Lula transcreveram em sua defesa declarações do ex e de Dilma favoráveis. A manobra fez com que o ex e a presidente emitissem sinais discretos de que acompanhavam o julgamento e, naturalmente, estavam atentos ao destino dos companheiros mensaleiros. O tempo todo a defesa de Dirceu repetiu aquelas declarações em vários memoriais.

Mas não ocorreu aquilo que Dirceu desejava — e que Genoino e Delúbio esperavam —, uma intervenção do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, junto aos membros do Supremo a favor dos petistas. Apenas dois dos juízes indicados pelo PT sempre defenderam Dirceu, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Para compensar, ambos descarregavam carga contra Genoino e Delúbio, dois réus desapontados com o governo, porém em silêncio.

Apenas mais tarde Cardoso, acionado por Lula, entrou em ação. A intervenção do ministro ocorreu na terça-feira, dia seguinte à condenação de Zé Dirceu a 10 anos e 10 meses, José Genoino a 6 anos e 11 meses e Delúbio Soares a 8 anos e 11 meses. Com um pronunciamento de Cardozo, iniciou-se a campanha em defesa do bem-estar dos condenados, inclusive na prisão.

O ministro da Justiça é escalado para fazer teatro
Na última virada da semana, num espaço de quatro dias o ministro José Eduardo Cardozo duas vezes entrou em cena. Tudo ocorreu num momento em que petistas, como Lula, aposentaram aquele discurso em que diziam que não existiu a compra de apoio no Congresso e que não havia prova da participação de Zé Dirceu no mensalão, muito menos no comando do esquema. Apenas Dirceu e o presidente do PT, Rui Falcão, esperneavam com alarde.
A última de Cardoso aconteceu em São Paulo na terça-feira. O ministro simulou um transe freudiano no momento em que ouviu a pergunta inesperada de um empresário num debate com o Grupo de Líderes Em­pre­sariais — “O senhor é a favor da pena de morte no Brasil?”, quis saber o empresário. O ministro reagiu como se fizesse um desabafo revelador de quem ouviu uma coisa e, em choque, despertou o inconsciente angustiado pelo mensalão:
— Os presídios no Brasil ainda são medievais. Entre passar anos num presídio no Brasil e perder a vida, talvez eu preferisse perder a vida, porque não há nada mais degradante do que ser violado em seus direitos humanos.
Com isso, ele chamou a a­tenção para os companheiros condenados como mensaleiros. Na realidade, do alto da posição de ministro da Justiça, Car­doso passava atestado de maus serviços aos presídios como quem sugere condições mais dignas aos réus, como a prisão em sala sem grades. Ou que um réu com pena menor, como Genoino, fique em casa.

Uma encenação com requintes freudianos
Vejamos o capricho da simulação. A pergunta era sobre pena de morte, algo sumário no desfecho. Cardozo respondeu sobre “passar anos num presídio”. O empresário paulista devia estar pensando na onda de violência em São Paulo, algo de efeito imediato no cotidiano urbano dele. O ministro a invocar a lembrança dos companheiros condenados:
O empresário perguntou uma coisa, o ministro respondeu ou­tra. A pergunta era sobre a pena de morte, impessoal, costumeira em momentos de exacerbação da violência urbana. O empresário abstraiu: a pena de morte é aplicada por juiz ou corpo de jurados a um réu. Car­dozo respondeu com um desabafo inesperado a partir do ponto de vista de presidiário, não necessariamente condenado à morte.
Apresentou um testemunho pessoal sobre a condição de preso. Per­sonalizou a resposta, colocou-se como personagem: “Talvez eu preferisse perder a vida”. Co­mo num transe freudiano, o ministro parecia alterar a personalidade, colocar-se como réu na posição de quem assume a identidade de um companheiro. Fingia o­perar com empatia, mas não em relação ao perguntador e sim a um su­posto réu. Cardozo não manteve distância neutra da questão, ao contrário do empresário.

Sem pressa na cobrança dos prejuízos causados à União



Porém, na vez anterior, Cardozo foi sincero como representante de um governo que não tem nenhuma pressa em assumir suas responsabilidades funcionais no pós-julgamento, como a reposição pelos condenados do dinheiro desviado de cofres públicos para atender o mensalão ou com a cobrança pelo fisco federal das multas estabelecidas pelo Supremo .

Agiu por impulso próprio e até violou aquela proibição de Dilma a comentários no governo sobre o julgamento do mensalão. Em conversa com um repórter, o ministro demonstrou que o governo não tem pressa para assumir o seu papel funcional no pós-julgamento, ainda não se alinhou para assumir as medidas complementares que lhe caberão para reparar os danos ao Estado ao final do julgamento pelo Supremo.

A questão das providências complementares ao julgamento foi apresentada ao ministro pelo repórter Vinicius Sassine, a quem Cardozo pediu calma, pois os efeitos do julgamento e das condenações não viriam tão cedo. Avisou o ministro que o governo assumirá as suas responsabilidades apenas depois da publicação do acórdão do Supremo, que pode demorar meses apesar da pressa do relator do processo no Supremo, Joaquim Barbosa.

“Quando a decisão do Supremo estiver estampada num acórdão, vamos ter o divisor de águas sobre o que foi dinheiro público e o que foi dinheiro privado”, ressalvou Cardozo como se o governo não pensasse em planejar a operação antes da publicação do acórdão. “O Supremo confirmou no voto, mas é preciso ver no texto o que ele vai precisar”, reconheceu que o tribunal decidiu que houve desvio de dinheiro público, mas ainda é preciso ler esse valor no acórdão.

Tudo bem, pode não ser ainda o momento para a cobrança burocrática da devolução do dinheiro, mas o ministro da Justiça repassa a impressão de que o governo trata a recuperação do prejuízo público como algo remoto. É como se o governo vivesse um pesadelo do qual poderia acordar a qualquer momento. O Supremo já estabeleceu que mensaleiros devem pagar multas, mas apenas no Judiciário a carruagem está em marcha.

Do outro lado da rua, nada evolui no Executivo E olha que o repórter abordou o ministro da num momento propício a reflexão, quando ele se retirava da Con­ferência Internacional Anti­cor­rupção, em Brasília. Cardozo esteve lá, mas não pegou o espírito da coisa. No entanto, foi naquela conferência que a presidente Dilma Rousseff, dois dias antes, apresentou-se com um discurso em defesa da imprensa como arma contra a corrupção, num gesto que parecia resposta à campanha do blog de Zé Dirceu em defesa do controle da mídia

— É sempre preferível o ruído da imprensa livre ao silêncio tumular das ditaduras.

A campanha a favor dos petistas recebe o apoio isolado no Supremo

Ao discurso de Cardoso em São Paulo se seguiu à adesão dos dois ministros que conduzem o mensalão no Supremo conforme o modelo desejado pelo PT, o revisor Ricardo Lewandowski e Dias Tof­foli. Fazendo de conta que não se referia a José Genoino, o único réu petista com pena que lhe permite a prisão em regime semiaberto, o revisor comentou com colegas que, no país, “a coisa mais difícil é vaga no semiaberto”. Antes disfarçou com sua experiência paulista:

— Cansei, como juiz do Tri­bunal de Alçada Criminal, de conceder habeas corpus para as pessoas cumprirem a pena no aberto.

No semiaberto, Genoino poderá cumprir a pena numa colônia com outros presos ou trabalhar fora e dormir em prisão tipo albergue. Se não houver vaga, Genoino poderia dormir em casa. Teria apenas a obrigação de se apresentar regularmente a um juiz designado e não sair da cidade sem autorização prévia. Privilégio de condenado a menos de oito anos de prisão.

Ex-assessor de Zé Dirceu e, como Lewandowski, nomeado ministro com a exigência de proteger o antigo chefe da Casa Civil do governo Lula, Toffoli comparou o julgamento do mensalão à In­quisição, onde facilmente os réus terminavam na fogueira. “Com­bina com o período medieval”, criticou, em sessão com os colegas, o rigor das penas aplicadas aos mensaleiros em geral. Defendeu a transformação de penas em multas simplesmente.

Com o incentivo de Lula, o comando nacional do PT soltou a nota em que menciona apenas Dirceu e acusa o Supremo, junto com a Procuradoria Geral Re­pública, pela “partidarização do Judiciário, evidente no julgamento” do mensalão. Ou seja, o PT de Lula e Dilma a aparelharam com juízes que seriam da confiança do partido, mas, na prática, quase todos se voltaram contra o criador.

A reação de Barbosa com a autoridade de futuro presidente do STF

Com a responsabilidade de quem assume a presidência do tribunal na quinta-feira, o ministro Joaquim Barbosa reagiu à campanha do PT ao assegurar que não haverá cela especial para os condenados. “A prisão especial é apenas para quem cumpre prisão provisória e não definitiva”, explicou, ou seja, não beneficia a quem foi condenado. Se depender dele na presidência, o acórdão estará pronto em meados do próximo semestre e os condenados presos em seguida.

Antes da posse, o tribunal deve discutir a questão dos três deputados condenados como mensaleiros: João Paulo, do PT de São Paulo, Pedro Henry, do PP de Mato Grosso; e Valdemar Costa Neto, do PR de São Paulo. Há ainda o suplente paulista Genoíno, que pretende assumir em janeiro a vaga de Carlinhos Almeida, eleito prefeito em São José dos Campos. A tendência do tribunal é pela perda automática do mandato de todos, mas o presidente da Câmara, petista gaúcho Marco Maia, pensa que apenas os deputados podem cassar os colegas.

Além de condenar os três petistas, durante a semana o julgamento puniu três dirigentes do Banco Rural, a presidente Katia Ra­belo e os vices José Roberto Sal­gado e Vinicius Samarane. Os dois primeiros pegaram a mesma pena: 16 anos e oito meses de prisão, com multa de R$ 1,5 milhão. Samarane se saiu com oito anos e nove meses de prisão, mais a multa de R$ 598 mil.

O PT pensa em socializar as multas com uma caixinha

Os três petistas condenados devem pagar , juntos, R$ 1,46 milhão em multas. O campeão é Zé Dirceu, com R$ 676 mil. Em segundo, José Genoino deve R$ 468 mil com dinheiro. O lanterna é Delúbio Soares, multado em R$ 325 mil. Os amigos dizem que a situação mais difícil é a de Genoino, incapaz de reunir aquela grana mesmo se vender a casa onde mora. Como não podem pagar com dinheiro do PT, nem se fosse caixa dois, petistas pensam numa caixinha.

Mas não há pressa com a caixinha, que atrairia a adesão de filiados, militantes e amigos. “Se precisar fazer um fundo solidário, o PT vai fazer, mas ainda é possível reverter as multas”, confia o coordenador jurídico do partido, Marco Aurélio de Carvalho, que a dívida pode ser extinta ou abatida com os recursos a serem apresentados ao Supremo pelos condenados. “Quero ser o primeiro a contribuir”, avisa o dirigente Paulo Frateschi.

Como não há pressa, a questão deve ser discutida pelo diretório nacional do PT numa reunião em dezembro. “Acredito que todos os dirigentes vão contribuir com o nosso fundo solidário”, anima-se Frateschi. “É o único caminho para ajudar”, reitera a impossibilidade de se usar fontes formais do abastecimento financeiro do partido. Com a eleição do petista Fernando Haddad a prefeito de São Paulo, s petistas contam com a boa disposição de companheiros e amigos.

Neles há também uma inspiração da campanha que reuniu dinheiro para a deputada Luiza Erundina, hoje no PSB, pagar uma dívida de R$ 325 mil imposta por condenação judicial quando foi prefeita de São Paulo pelo PT. Num movimento suprapartidário, o dinheiro foi reunido com doações e jantares, depositado numa conta bancária criada pelo movimento.

www.jornalopcao.com.br

Nenhum comentário:

Piso salarial do professor: saiba quem tem direito ao reajuste nacional

  Presidente Jair Bolsonaro divulgou na tarde de hoje (27) um reajuste de cerca de 33% no piso salarial do professor de educação básica; con...