segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Consciência crítica para lutar



19 de setembro de 2011
A greve dos professores do Ceará vive sua conjuntura mais complexa. Do lado do governo adotou-se o silêncio de quem espera ver o adversário se consumir no cansaço e na cizânia. De sua parte o poder judiciário  forneceu a mais eloqüente prova de sua subserviência, decretando a suspensão da greve com base em argumentos falhos  que se impõem apenas por conta do poder discricionário que se concede a um desembargador.Poder discricionário esse que, não raras vezes,  age em benefício do mais poderoso. Do lado dos grevistas, passou a predominar a visão e a ação por vezes inconsciente e inconseqüente de quem, na prática, ajuda o governo no seu propósito de espremer e asfixiar o movimento.

Temos de reconhecer que o sindicato foi atropelado na direção da greve por agrupamentos políticos que, através de discursos ardilosos e manobras capciosas, confundiram a base, confundindo-se com ela, capturando as ilusões de amplos setores da categoria.  Suas concepções dogmáticas não lhes permitem captar a variedade cromática do mundo porque só conseguem percebê-lo em duas cores;  Pintando assim, um quadro conceitual de natureza morta, e mortal, pois ao almejar o impossível, impede a categoria de vislumbrar e de se empenhar na construção do possível.
A APEOC, infelizmente, contribuiu de maneira decisiva para que chegássemos a esse estado de coisas, cometendo graves equívocos. Seria mais correto dizer, um grave equívoco, que foi se desdobrando em outros menores que têm comprometido todos os esforços posteriores para levar o movimento à vitória.
Não falhou no cumprimento de suas obrigações para com o esforço de greve, como leviana e cinicamente acusam seus raivosos opositores.  Pelo contrário, encerradas as negociações de forma unilateral pelo governo, não hesitou em deflagrar a greve, garantindo-lhe toda a estrutura necessária para que de fato acontecesse. No entanto, a se basear no que dizem os da patuléia de oposição que se alimentam do afã de difamar o sindicato, acusam-no de ser contrário à greve, de estar sabotando a luta e de estar se eximindo de disponibilizar os recursos necessários para sua sustentação financeira. Acusações falsas baseadas em ilações, hipóteses e futricas temperadas com discursos  carregados de chavões e ideologismo vazio. Para se comprovar isso não se precisa de muito esforço; afinal, quem pagou pelos ginásios onde se realizam as assembléias, equipamentos e carros de som, boletins e outros materiais, transporte e infra-estrutura em geral!? Em alguns locais, muitas vezes por conta da celeridade das ações a serem realizados, eventualmente  companheiros e companheiras se cotizaram junto com  as comunidades   para dar encaminhamento a uma ou outra atividade de menor envergadura.Portanto não foi por aí que a APEOC pecou. Seu erro se deu justamente no excesso de confiança e de boa vontade depositadas em quem não merecia gozar de nenhum desses benefícios. Em quem desde o início do processo demonstrou desconfiança e má vontade com a linha de trabalho e de luta adotados pela entidade. Depreciaram e ainda depreciam os resultados das negociações e tentaram antecipar a deflagração da greve visando abortá-la em seu nascedouro. Paradoxalmente, depois de deflagrada, foram alçados à sua direção através  de um comando que passou a ser composto em sua maioria pelos inimigos da APEOC na categoria. Fracassados em sua tentativa de abortá-la passaram a atuar no sentido de impedir qualquer possibilidade de resultado positivo para a greve, com manobras que visam manter o movimento radicalizado e imune a qualquer brecha que permita a superação do impasse com o governo. A unidade que até recentemente representava para eles uma palavra maldita, pois não podiam se misturar aos “pelegos” da APEOC, agora é arrotada acintosamente e manipulada para promover a “unidade” para derrotar.
É a mesma "unidade" que o parasita promove junto ao corpo hospedeiro para sugar sua seiva vital até reduzi-lo à inação.
Costumam demonizar ou menosprezar alguns dos procedimentos e ações que se apresentam como recursos fundamentais para levar a luta sindical à vitória. Em seu entendimento, toda negociação p ex, nãopassa de “negociata”. Foi a APEOC quem reabilitou na categoria o conceito de negociação como um momento fundamental da luta, e até mesmo fazê-la reconhecer como próprio da rotina da atividade sindical. Antes disso, fizemos ver a importância da unidade nas lutas, numa época que se encerravam as assembléias do SINDIUTE religiosamente com a proposta protocolar de desfiliação em massa da APEOC. Promovendo-se um verdadeiro concurso entre as correntes ultras esquerdistas para saber quem batia com mais força e gás no sindicato. Nos dias de hoje tentam se apresentar como os campeões da unidade repetindo mecanicamente essa palavra, sem que expliquem qual o significado que ela tem para eles. Mas não precisam explicar nada, pois a cada dia que passa fica mais claro que invocam a unidade para derrotar e não para aumentar as possibilidades de vitória. Isso porque a vitória dos professores do estado significaria um terrível contraste com a derrota acachapante da greve do magistério municipal, conduzida, melhor dizendo, mal conduzida por eles.  Derrotados por  lá, correram para garantir seu espaço no Comando de Greve dos  estaduais, encampada pela APEOC. Encontraram seu Cavalo de Tróia, introduzido na greve para sabotá-la a partir de dentro. É isso precisamente o conteúdo de seu conceito deformado de unidade.
Que defendemos nesse momento um recuo tático da categoria para o Estado de Greve não é estranho a ninguém.  No desenrolar de um confronto essa possibilidade não pode ser de maneira alguma desconsiderada, tanto na luta sindical, como em diversas outras esferas da vida social. Seja na guerra, no esporte, e até mesmo no embate cotidiano pela sobrevivência e conquista de seu espaço na vida em sociedade, qualquer indivíduo é forçado a promover algum movimento de recuo diante de uma dificuldade que se revele de difícil superação. Como já dissemos em outra ocasião, ter coragem e estar com a razão é condição necessária, mas não suficiente para se obter êxito  em um enfrentamento. Quando este se revela longo e cheio de percalços então se deve mais ainda levar em conta essa possibilidade.
Hoje atacam essa tática como uma verdadeira heresia que sequer pode ser considerada e posta para discussão. Quem a sugerir arrisca ser xingado, maltratado e atingido em sua honra e dignidade.  Adota-se um senso comum enrijecido, que não permite  qualquer tipo de questionamento. Enfim, uma postura dogmática que serve de campo de cultura para o florescimento de doutrinas de matriz proto fascistas que nessa fase,  costumam se confundir com pretensos ativismos de esquerda. Uma espécie de fascismo vermelho, por mais estranho que possa parecer esse conceito.
Ora, esse modo de ver e tratar as coisas são extremamente prejudiciais ao andamento da luta, funcionando como um antolho que impede de se enxergar algo além daquilo que está imediatamente a frente, se andando como um rebanho que marcha celeremente em direção ao matadouro. Não consideram cenários que se apresentem como alternativos àquele que o antolho lhes permite ver, de tal maneira que não se ocupam a dar ouvidos a quem possa lhes sugerir caminhos diferentes.
Afinal, os professores, mais do ninguém, sabem o quanto a ignorância é arrogante!
Em face do exposto, mais uma vez chamamos a atenção para o diferencial de nossa categoria em relação aos demais setores da classe trabalhadora, justamente por ter o saber e a cultura como a matéria prima de seu trabalho. Sendo assim, ao menos deveria contar com ferramentas intelectuais minimamente suficientes para imunizá-la desse tipo rude e grosseiro de pensar e agir.
Em um momento como esse é que devemos exercer com toda propriedade o que sempre alegamos querer desenvolver em nossos alunos no dia a dia da sala de aula, mas que vemos não passar de um discurso desprovido de qualquer conteúdo na boca de alguns de nossos colegas: a consciência crítica.
Fábio Lopes

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