Acompanhe por esse blog todos os passos de Bento XVI na Alemanha.
Leonardo Meira
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Amados irmãos e irmãs no Senhor!
"Não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em Mim, por meio da sua palavra (Jo 17, 20): segundo o Evangelho de João, assim Se dirigiu Jesus ao Pai no Cenáculo. Intercede pelas futuras gerações de crentes. Estende o olhar, mais além do Cenáculo, para o futuro. Rezou também por nós. E reza pela nossa unidade. Esta oração de Jesus não é algo simplesmente do passado. Ele está sempre diante do Pai, intercedendo por nós, e é assim que Ele, nesta hora, está no meio de nós e nos quer atrair para dentro da sua oração. Na oração de Jesus, encontra-se o lugar interior da nossa unidade. Tornar-nos-emos um só, se nos deixarmos atrair para dentro de tal oração. Todas as vezes que nos encontramos, como cristãos, reunidos na oração, esta luta de Jesus relativa a nós e com o Pai em nosso favor deveria tocar-nos profundamente no coração. Quanto mais nos deixarmos atrair nesta dinâmica, tanto mais se realizará a unidade.
Porventura ficou desatendida a oração de Jesus? A história do cristianismo é, por assim dizer, o lado visível deste drama, no qual Cristo luta e sofre conosco, seres humanos. Sem cessar Ele tem de suportar o contraste com a unidade, e todavia não cessa jamais de realizar-se também a unidade com Ele e, deste modo, com o Deus trinitário. Devemos ver ambas as coisas: o pecado do homem, que se nega a Deus fechando-se em si mesmo, mas também as vitórias de Deus, que sustenta a Igreja não obstante a sua fraqueza, e atrai continuamente homens para dentro de Si aproximando-os assim uns dos outros. Por isso, num encontro ecumênico, não devemos só lamentar as divisões e as separações, mas também agradecer a Deus por todos os elementos de unidade que conservou para nós e incessantemente nos concede. E esta gratidão deve ao mesmo tempo tornar-se disponibilidade para não perder, no meio de um tempo de tentação e de perigos, a unidade assim concedida.
A unidade fundamental consiste no fato de acreditarmos em Deus, Pai onipotente, Criador do céu e da terra; de O confessarmos como Deus trinitário – Pai, Filho e Espírito Santo. A unidade suprema não é solidão duma mônada, mas unidade através do amor. Acreditamos em Deus, no Deus concreto. Acreditamos no fato que Deus nos falou e Se fez um de nós. Dar testemunho deste Deus vivo é a nossa tarefa comum no momento atual.
O homem tem necessidade de Deus, ou, pelo contrário, as coisas continuam bastante bem mesmo sem Ele? Quando, numa primeira fase da ausência de Deus, a sua luz continua ainda a enviar os seus reflexos e mantém unida a ordem da existência humana, tem-se a impressão de que as coisas funcionem mesmo sem Deus. Mas, à medida que o mundo se afasta de Deus, vai-se tornando cada vez mais claro que o homem, na petulância do poder, no vazio do coração e na ânsia de prazer e felicidade, "perde" progressivamente a vida. A sede de infinito está presente no homem de modo inextirpável. O homem foi criado para a relação com Deus e precisa d'Ele. Neste tempo, o nosso primeiro serviço ecumênico deve ser testemunharmos juntos a presença de Deus vivo e, deste modo, dar ao mundo a resposta de que tem necessidade. Naturalmente, deste testemunho fundamental de Deus faz parte depois, de maneira absolutamente central, o testemunho de Jesus Cristo, verdadeiro homem e verdadeiro Deus, que viveu no nosso meio, sofreu por nós, morreu por nós e, na ressurreição, abriu de par em par a porta da morte. Queridos amigos, fortaleçamo-nos nesta fé! Ajudemo-nos mutuamente a vivê-la! Trata-se de uma grande tarefa ecumênica, que nos introduz no coração da oração de Jesus.
A seriedade da fé em Deus manifesta-se na vivência da sua palavra. No nosso tempo, manifesta-se, de modo muito concreto, no empenho por aquela criatura que Ele quis à sua imagem: o homem. Vivemos num tempo em que se tornaram incertos os critérios de ser homem. A ética foi substituída pelo cálculo das consequências. Perante isto,devemos, como cristãos, defender a dignidade inviolável do homem, desde a sua concepção até à morte: nas questões desde o diagnóstico de pré-implantação até à eutanásia. "Só quem conhece Deus, é que conhece o homem" – disse uma vez Romano Guardini. Sem o conhecimento de Deus, o homem torna-se manipulável. A fé em Deus deve-se concretizar-se no nosso empenho comum pelo homem. Fazem parte de tal empenho pelo homem não só estes critérios fundamentais de humanidade, mas, sobretudo, e de forma muito concreta, o amor que Jesus nos ensina na descrição do Juízo Final (Mt 25, 31-46): o juiz divino julgar-nos-á segundo o modo como nos comportamos para com aqueles que estão próximo de nós, para com os mais pequenos dos nossos irmãos. A disponibilidade para dar ajuda nas necessidades deste tempo, mesmo para além do próprio ambiente de vida, é uma tarefa essencial do cristão.
Isto vale, antes de mais nada, no âmbito da vida pessoal de cada um. Vale, depois, na comunidade de um povo e de um Estado, onde todos devem cuidar uns dos outros. Vale para o nosso Continente, sendo nós chamados à solidariedade na Europa. E vale, enfim, para além de todas as fronteiras: hoje a caridade cristã exige o nosso empenho mesmo pela justiça no mundo em toda a sua vastidão. Sei que muito se faz, da parte dos alemães e da Alemanha, para tornar possível a toda a humanidade uma vida digna do homem, e por isso quero aqui exprimir uma palavra de viva gratidão.
Por fim quero ainda acenar a uma dimensão mais profunda da nossa obrigação de amar. A seriedade da fé manifesta-se também e sobretudo quando esta inspira certas pessoas a colocarem-se totalmente à disposição de Deus e, partir de Deus, também dos outros. As grandes ajudas tornam-se concretas só quando, num lugar, vivem aqueles que estão totalmente à disposição do outro e, deste modo, tornam credível o amor de Deus. Pessoas assim são um sinal importante para a verdade da nossa fé.
Nas vésperas da vinda do Papa, falou-se diversas vezes de um dom ecumênico do hóspede que se esperava desta visita. Não é preciso especificar os dons mencionados em tal contexto. A propósito, quero dizer que isto constitui um equívoco político da fé e do ecumenismo. Quando um Chefe de Estado visita um país amigo, geralmente a sua vinda é antecedida por contatos das devidas instâncias que preparam a estipulação de um ou mesmo vários acordos entre os dois Estados: ponderando vantagens e desvantagens chega-se a um compromisso que, em última análise, aparece vantajoso para ambas as partes, de tal modo que depois o tratado pode ser assinado. Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens e desvantagens. Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A fé não é algo que nós esquadrinhamos ou concordamos. É o fundamento sobre o qual vivemos. A unidade não cresce através da ponderação de vantagens e desvantagens, mas só graças a uma penetração cada vez mais profunda na fé mediante o pensamento e a vida. Assim nos últimos cinquenta anos, e particularmente desde a visita do Papa João Paulo II há trinta anos, cresceram muito os pontos comuns, fato este de que podemos apenas sentir-nos agradecidos. Apraz-me recordar o encontro com a comissão guiada pelo Bispo [luterano] Lohse, na qual nos exercitamos juntos nesta penetração de modo profundo na fé mediante o pensamento e a vida. A quantos colaboraram para isso – nomeadamente, na parte católica, o Cardeal Lehmann – quero exprimir o meu vivo agradecimento. Não menciono outros nomes; o Senhor conhece-os todos. Todos juntos podemos apenas agradecer ao Senhor os caminhos da unidade por onde nos conduziu e associarmo-nos com humilde confiança à sua oração: Fazei que nos tornemos um só, como Vós sois um só com o Pai, "para que o mundo creia que Ele Vos enviou" (cf. Jo 17, 21).
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A partir das especulações que antecederam a viagem, segundo as quais falou-se diversas vezes de um "dom ecumênico" do hóspede, o Papa, o próprio Bento XVI aproveitou para esclarecer qual é a essência da fé.
"Não é preciso especificar os dons mencionados em tal contexto. A propósito, quero dizer que isto constitui um equívoco político da fé e do ecumenismo. Quando um Chefe de Estado visita um país amigo, geralmente a sua vinda é antecedida por contatos das devidas instâncias que preparam a estipulação de um ou mesmo vários acordos entre os dois Estados: ponderando vantagens e desvantagens chega-se a um compromisso que, em última análise, aparece vantajoso para ambas as partes, de tal modo que depois o tratado pode ser assinado. Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens e desvantagens. Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A fé não é algo que nós esquadrinhamos ou concordamos. É o fundamento sobre o qual vivemos. A unidade não cresce através da ponderação de vantagens e desvantagens, mas só graças a uma penetração cada vez mais profunda na fé mediante o pensamento e a vida".
Ecumenismo e tarefa cristã
A partir de um trecho do Evangelho de São João - "Não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em Mim, por meio da sua palavra (17, 20) -, o Papa salientou que Jesus está sempre diante do Pai, intercedendo por nós. "Na oração de Jesus, encontra-se o lugar interior da nossa unidade. Tornar-nos-emos um só, se nos deixarmos atrair para dentro de tal oração", indicou.
O Bispo de Roma lembrou que, em um encontro ecumênico, não se deve só lamentar as divisões e as separações, mas também agradecer a Deus por todos os elementos de unidade que conservou e incessantemente concede.
"E esta gratidão deve ao mesmo tempo tornar-se disponibilidade para não perder, no meio de um tempo de tentação e de perigos, a unidade assim concedida. A unidade fundamental consiste no fato de acreditarmos em Deus, Pai onipotente, Criador do céu e da terra; Acreditamos em Deus, no Deus concreto. Acreditamos no fato que Deus nos falou e Se fez um de nós. Dar testemunho deste Deus vivo é a nossa tarefa comum no momento atual".
Bento XVI também ressaltou que a seriedade da fé em Deus manifesta-se na vivência da sua palavra.
"Devemos, como cristãos, defender a dignidade inviolável do homem, desde a sua concepção até à morte. Sem o conhecimento de Deus, o homem torna-se manipulável. A fé em Deus deve-se concretizar-se no nosso empenho comum pelo homem. [...] A disponibilidade para dar ajuda nas necessidades deste tempo é uma tarefa essencial do cristão. [...] Hoje, a caridade cristã exige o nosso empenho mesmo pela justiça no mundo em toda a sua vastidão", salientou.
Itinerário da sexta-feira
O primeiro compromisso do Papa é com cerca de 15 Representantes das Comunidades Muçulmanas presentes na Alemanha, aos quais o Santo Padre dirige um discurso. O encontro acontece na Nunciatura Apostólica de Berlim, às 9h (hora local - 4h no horário de Brasília), após o Pontífice celebrar a Missa privada e saudar os colaboradores da Nunciatura. Ao final, o Papa dirige-se ao Aeroporto de Berlin-Tegel, de onde parte em direção a Erfurt.
Bento XVI chega no Aeroporto de Erfurt às 10h45 (hora local - 5h45 no horário de Brasília), onde é acolhido pelo Bispo, Dom Joachim Wanke, e outras autoridades civis e religiosas. Logo depois, dirige-se à Catedral da cidade,dedicada à Santa Maria. Após a adoração ao Santíssimo Sacramento e veneração do Relicário de São Bonifacio, em uma sala contígua, saúda 15 professores de Teologia na Universidade de Erfurt e assina o Livro de Ouro da Turíngia e da cidade de Erfurt na presença do Presidente e do Prefeito. Então, presta homenagem diante do túmulo do Bispo Hugo Aufderbeck. Depois, entra novamente na Igreja e venera a antiga estátua de Nossa Senhora Sedes Sapientiae. Ao deixar a Catedral, dirige-se para o antigo Convento dos Agostinianos, onde Lutero iniciou seu caminho teológico.
Na Sala do Capítulo do Convento dos Agostinianos (Augustinerkloster) de Erfurt, às 11h45 (hora local - 6h45 no horário de Brasília), encontra-se com os representantes do Conselho Igreja Evangélica Alemã (Evangelische Kirche in Deutschland, EKD). É acolhido pelo Presidente da Igreja Evangélica Alemã, pastor Nikolaus Schneider, e pelo Presidente da Igreja Evangélica da Turíngia, Katrin Göring-Eckardt, juntamente com 15 representantes do Conselho da EKD. Após a saudação dos representantes evangélicos, Bento XVI pronuncia um discurso aos presentes.
Às 12h20 (hora local - 7h20 no horário de Brasília), no ex-Convento dos Agostinianos, o Santo Padre participa da Celebração Ecumênica com a Igreja Evangélica na Alemanha. A celebração inicia com um canto, a oração inicial e a recitação de um Salmo lido pelo Bispo evangélico, professor Friedrich Weber, na tradução alemã de Martinho Lutero. Após a saudação da presidente do Sínodo da EKD, Katrin Göring-Eckhardt, o Papa recita a Oração pela Unidade dos Cristãos e o presidente do Pontifício Conselho para a Unidade dos Cristãos, Cardeal Kurt Koch, lê a oração sacerdotal de Jesus: "Que todos sejam um" (Jo 17, 1.20-23). O Papa pronuncia um discurso aos presentes.
Após a oração dos fiéis e a oração do Pai Nosso, o presidente do Conselho da EKD invoca a bênção aronítica e, logo depois, o Papa concede a bênção na forma trinitária. Concluída a Celebração Ecumênica, Bento XVI encaminha-se para o Seminário de Erfurt, onde, às 13h20 (hora local - 8h20 no horário de Brasília), almoça com os membros do Séquito papal.
Fonte: Canção Nova
Leonardo Meira
Da Redação
Montagem sobre fotos / AP
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Papa pronuncia discurso na Igreja do ex-Convento dos Agostinianos, em Erfurt. Abaixo, concede a bênção, ao lado do pastor luterano Nikolaus Schneider
O Papa Bento XVI deu mais um passo histórico no caminho ecumênico entre as Igrejas Católica e Luterana. O Pontífice visitou a Igreja do Convento dos Agostinianos em Erfurt, onde Martinho Lutero deu início ao seu estudo teológico, e participou de uma Celebração Ecumênica, na manhã desta sexta-feira, 23.
"À medida que o mundo se afasta de Deus, vai-se tornando cada vez mais claro que o homem, na petulância do poder, no vazio do coração e na ânsia de prazer e felicidade, 'perde' progressivamente a vida. O homem foi criado para a relação com Deus e precisa d'Ele. O nosso primeiro serviço ecumênico deve ser testemunharmos juntos a presença de Deus vivo e, deste modo, dar ao mundo a resposta de que tem necessidade", indicou.
Acesse
.: NA ÍNTEGRA: Discurso de Bento XVI na Celebração Ecumênica em Erfurt
"À medida que o mundo se afasta de Deus, vai-se tornando cada vez mais claro que o homem, na petulância do poder, no vazio do coração e na ânsia de prazer e felicidade, 'perde' progressivamente a vida. O homem foi criado para a relação com Deus e precisa d'Ele. O nosso primeiro serviço ecumênico deve ser testemunharmos juntos a presença de Deus vivo e, deste modo, dar ao mundo a resposta de que tem necessidade", indicou.
Acesse
.: NA ÍNTEGRA: Discurso de Bento XVI na Celebração Ecumênica em Erfurt
Discurso de Bento XVI na Celebração Ecumênica em Erfurt
Boletim da Sala de Imprensa da Santa Sé
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Discurso de Bento XVI
Viagem Apostólica à Alemanha (22-25 de setembro de 2011)
Igreja do Convento dos Agostinianos, Erfurt-Alemanha
23 de setembro de 2011
Amados irmãos e irmãs no Senhor!
"Não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em Mim, por meio da sua palavra (Jo 17, 20): segundo o Evangelho de João, assim Se dirigiu Jesus ao Pai no Cenáculo. Intercede pelas futuras gerações de crentes. Estende o olhar, mais além do Cenáculo, para o futuro. Rezou também por nós. E reza pela nossa unidade. Esta oração de Jesus não é algo simplesmente do passado. Ele está sempre diante do Pai, intercedendo por nós, e é assim que Ele, nesta hora, está no meio de nós e nos quer atrair para dentro da sua oração. Na oração de Jesus, encontra-se o lugar interior da nossa unidade. Tornar-nos-emos um só, se nos deixarmos atrair para dentro de tal oração. Todas as vezes que nos encontramos, como cristãos, reunidos na oração, esta luta de Jesus relativa a nós e com o Pai em nosso favor deveria tocar-nos profundamente no coração. Quanto mais nos deixarmos atrair nesta dinâmica, tanto mais se realizará a unidade.
Porventura ficou desatendida a oração de Jesus? A história do cristianismo é, por assim dizer, o lado visível deste drama, no qual Cristo luta e sofre conosco, seres humanos. Sem cessar Ele tem de suportar o contraste com a unidade, e todavia não cessa jamais de realizar-se também a unidade com Ele e, deste modo, com o Deus trinitário. Devemos ver ambas as coisas: o pecado do homem, que se nega a Deus fechando-se em si mesmo, mas também as vitórias de Deus, que sustenta a Igreja não obstante a sua fraqueza, e atrai continuamente homens para dentro de Si aproximando-os assim uns dos outros. Por isso, num encontro ecumênico, não devemos só lamentar as divisões e as separações, mas também agradecer a Deus por todos os elementos de unidade que conservou para nós e incessantemente nos concede. E esta gratidão deve ao mesmo tempo tornar-se disponibilidade para não perder, no meio de um tempo de tentação e de perigos, a unidade assim concedida.
A unidade fundamental consiste no fato de acreditarmos em Deus, Pai onipotente, Criador do céu e da terra; de O confessarmos como Deus trinitário – Pai, Filho e Espírito Santo. A unidade suprema não é solidão duma mônada, mas unidade através do amor. Acreditamos em Deus, no Deus concreto. Acreditamos no fato que Deus nos falou e Se fez um de nós. Dar testemunho deste Deus vivo é a nossa tarefa comum no momento atual.
O homem tem necessidade de Deus, ou, pelo contrário, as coisas continuam bastante bem mesmo sem Ele? Quando, numa primeira fase da ausência de Deus, a sua luz continua ainda a enviar os seus reflexos e mantém unida a ordem da existência humana, tem-se a impressão de que as coisas funcionem mesmo sem Deus. Mas, à medida que o mundo se afasta de Deus, vai-se tornando cada vez mais claro que o homem, na petulância do poder, no vazio do coração e na ânsia de prazer e felicidade, "perde" progressivamente a vida. A sede de infinito está presente no homem de modo inextirpável. O homem foi criado para a relação com Deus e precisa d'Ele. Neste tempo, o nosso primeiro serviço ecumênico deve ser testemunharmos juntos a presença de Deus vivo e, deste modo, dar ao mundo a resposta de que tem necessidade. Naturalmente, deste testemunho fundamental de Deus faz parte depois, de maneira absolutamente central, o testemunho de Jesus Cristo, verdadeiro homem e verdadeiro Deus, que viveu no nosso meio, sofreu por nós, morreu por nós e, na ressurreição, abriu de par em par a porta da morte. Queridos amigos, fortaleçamo-nos nesta fé! Ajudemo-nos mutuamente a vivê-la! Trata-se de uma grande tarefa ecumênica, que nos introduz no coração da oração de Jesus.
A seriedade da fé em Deus manifesta-se na vivência da sua palavra. No nosso tempo, manifesta-se, de modo muito concreto, no empenho por aquela criatura que Ele quis à sua imagem: o homem. Vivemos num tempo em que se tornaram incertos os critérios de ser homem. A ética foi substituída pelo cálculo das consequências. Perante isto,devemos, como cristãos, defender a dignidade inviolável do homem, desde a sua concepção até à morte: nas questões desde o diagnóstico de pré-implantação até à eutanásia. "Só quem conhece Deus, é que conhece o homem" – disse uma vez Romano Guardini. Sem o conhecimento de Deus, o homem torna-se manipulável. A fé em Deus deve-se concretizar-se no nosso empenho comum pelo homem. Fazem parte de tal empenho pelo homem não só estes critérios fundamentais de humanidade, mas, sobretudo, e de forma muito concreta, o amor que Jesus nos ensina na descrição do Juízo Final (Mt 25, 31-46): o juiz divino julgar-nos-á segundo o modo como nos comportamos para com aqueles que estão próximo de nós, para com os mais pequenos dos nossos irmãos. A disponibilidade para dar ajuda nas necessidades deste tempo, mesmo para além do próprio ambiente de vida, é uma tarefa essencial do cristão.
Isto vale, antes de mais nada, no âmbito da vida pessoal de cada um. Vale, depois, na comunidade de um povo e de um Estado, onde todos devem cuidar uns dos outros. Vale para o nosso Continente, sendo nós chamados à solidariedade na Europa. E vale, enfim, para além de todas as fronteiras: hoje a caridade cristã exige o nosso empenho mesmo pela justiça no mundo em toda a sua vastidão. Sei que muito se faz, da parte dos alemães e da Alemanha, para tornar possível a toda a humanidade uma vida digna do homem, e por isso quero aqui exprimir uma palavra de viva gratidão.
Por fim quero ainda acenar a uma dimensão mais profunda da nossa obrigação de amar. A seriedade da fé manifesta-se também e sobretudo quando esta inspira certas pessoas a colocarem-se totalmente à disposição de Deus e, partir de Deus, também dos outros. As grandes ajudas tornam-se concretas só quando, num lugar, vivem aqueles que estão totalmente à disposição do outro e, deste modo, tornam credível o amor de Deus. Pessoas assim são um sinal importante para a verdade da nossa fé.
Nas vésperas da vinda do Papa, falou-se diversas vezes de um dom ecumênico do hóspede que se esperava desta visita. Não é preciso especificar os dons mencionados em tal contexto. A propósito, quero dizer que isto constitui um equívoco político da fé e do ecumenismo. Quando um Chefe de Estado visita um país amigo, geralmente a sua vinda é antecedida por contatos das devidas instâncias que preparam a estipulação de um ou mesmo vários acordos entre os dois Estados: ponderando vantagens e desvantagens chega-se a um compromisso que, em última análise, aparece vantajoso para ambas as partes, de tal modo que depois o tratado pode ser assinado. Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens e desvantagens. Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A fé não é algo que nós esquadrinhamos ou concordamos. É o fundamento sobre o qual vivemos. A unidade não cresce através da ponderação de vantagens e desvantagens, mas só graças a uma penetração cada vez mais profunda na fé mediante o pensamento e a vida. Assim nos últimos cinquenta anos, e particularmente desde a visita do Papa João Paulo II há trinta anos, cresceram muito os pontos comuns, fato este de que podemos apenas sentir-nos agradecidos. Apraz-me recordar o encontro com a comissão guiada pelo Bispo [luterano] Lohse, na qual nos exercitamos juntos nesta penetração de modo profundo na fé mediante o pensamento e a vida. A quantos colaboraram para isso – nomeadamente, na parte católica, o Cardeal Lehmann – quero exprimir o meu vivo agradecimento. Não menciono outros nomes; o Senhor conhece-os todos. Todos juntos podemos apenas agradecer ao Senhor os caminhos da unidade por onde nos conduziu e associarmo-nos com humilde confiança à sua oração: Fazei que nos tornemos um só, como Vós sois um só com o Pai, "para que o mundo creia que Ele Vos enviou" (cf. Jo 17, 21).
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A partir das especulações que antecederam a viagem, segundo as quais falou-se diversas vezes de um "dom ecumênico" do hóspede, o Papa, o próprio Bento XVI aproveitou para esclarecer qual é a essência da fé.
"Não é preciso especificar os dons mencionados em tal contexto. A propósito, quero dizer que isto constitui um equívoco político da fé e do ecumenismo. Quando um Chefe de Estado visita um país amigo, geralmente a sua vinda é antecedida por contatos das devidas instâncias que preparam a estipulação de um ou mesmo vários acordos entre os dois Estados: ponderando vantagens e desvantagens chega-se a um compromisso que, em última análise, aparece vantajoso para ambas as partes, de tal modo que depois o tratado pode ser assinado. Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas vantagens e desvantagens. Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A fé não é algo que nós esquadrinhamos ou concordamos. É o fundamento sobre o qual vivemos. A unidade não cresce através da ponderação de vantagens e desvantagens, mas só graças a uma penetração cada vez mais profunda na fé mediante o pensamento e a vida".
Ecumenismo e tarefa cristã
A partir de um trecho do Evangelho de São João - "Não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em Mim, por meio da sua palavra (17, 20) -, o Papa salientou que Jesus está sempre diante do Pai, intercedendo por nós. "Na oração de Jesus, encontra-se o lugar interior da nossa unidade. Tornar-nos-emos um só, se nos deixarmos atrair para dentro de tal oração", indicou.
O Bispo de Roma lembrou que, em um encontro ecumênico, não se deve só lamentar as divisões e as separações, mas também agradecer a Deus por todos os elementos de unidade que conservou e incessantemente concede.
"E esta gratidão deve ao mesmo tempo tornar-se disponibilidade para não perder, no meio de um tempo de tentação e de perigos, a unidade assim concedida. A unidade fundamental consiste no fato de acreditarmos em Deus, Pai onipotente, Criador do céu e da terra; Acreditamos em Deus, no Deus concreto. Acreditamos no fato que Deus nos falou e Se fez um de nós. Dar testemunho deste Deus vivo é a nossa tarefa comum no momento atual".
Bento XVI também ressaltou que a seriedade da fé em Deus manifesta-se na vivência da sua palavra.
"Devemos, como cristãos, defender a dignidade inviolável do homem, desde a sua concepção até à morte. Sem o conhecimento de Deus, o homem torna-se manipulável. A fé em Deus deve-se concretizar-se no nosso empenho comum pelo homem. [...] A disponibilidade para dar ajuda nas necessidades deste tempo é uma tarefa essencial do cristão. [...] Hoje, a caridade cristã exige o nosso empenho mesmo pela justiça no mundo em toda a sua vastidão", salientou.
Itinerário da sexta-feira
O primeiro compromisso do Papa é com cerca de 15 Representantes das Comunidades Muçulmanas presentes na Alemanha, aos quais o Santo Padre dirige um discurso. O encontro acontece na Nunciatura Apostólica de Berlim, às 9h (hora local - 4h no horário de Brasília), após o Pontífice celebrar a Missa privada e saudar os colaboradores da Nunciatura. Ao final, o Papa dirige-se ao Aeroporto de Berlin-Tegel, de onde parte em direção a Erfurt.
Bento XVI chega no Aeroporto de Erfurt às 10h45 (hora local - 5h45 no horário de Brasília), onde é acolhido pelo Bispo, Dom Joachim Wanke, e outras autoridades civis e religiosas. Logo depois, dirige-se à Catedral da cidade,dedicada à Santa Maria. Após a adoração ao Santíssimo Sacramento e veneração do Relicário de São Bonifacio, em uma sala contígua, saúda 15 professores de Teologia na Universidade de Erfurt e assina o Livro de Ouro da Turíngia e da cidade de Erfurt na presença do Presidente e do Prefeito. Então, presta homenagem diante do túmulo do Bispo Hugo Aufderbeck. Depois, entra novamente na Igreja e venera a antiga estátua de Nossa Senhora Sedes Sapientiae. Ao deixar a Catedral, dirige-se para o antigo Convento dos Agostinianos, onde Lutero iniciou seu caminho teológico.
Na Sala do Capítulo do Convento dos Agostinianos (Augustinerkloster) de Erfurt, às 11h45 (hora local - 6h45 no horário de Brasília), encontra-se com os representantes do Conselho Igreja Evangélica Alemã (Evangelische Kirche in Deutschland, EKD). É acolhido pelo Presidente da Igreja Evangélica Alemã, pastor Nikolaus Schneider, e pelo Presidente da Igreja Evangélica da Turíngia, Katrin Göring-Eckardt, juntamente com 15 representantes do Conselho da EKD. Após a saudação dos representantes evangélicos, Bento XVI pronuncia um discurso aos presentes.
Às 12h20 (hora local - 7h20 no horário de Brasília), no ex-Convento dos Agostinianos, o Santo Padre participa da Celebração Ecumênica com a Igreja Evangélica na Alemanha. A celebração inicia com um canto, a oração inicial e a recitação de um Salmo lido pelo Bispo evangélico, professor Friedrich Weber, na tradução alemã de Martinho Lutero. Após a saudação da presidente do Sínodo da EKD, Katrin Göring-Eckhardt, o Papa recita a Oração pela Unidade dos Cristãos e o presidente do Pontifício Conselho para a Unidade dos Cristãos, Cardeal Kurt Koch, lê a oração sacerdotal de Jesus: "Que todos sejam um" (Jo 17, 1.20-23). O Papa pronuncia um discurso aos presentes.
Após a oração dos fiéis e a oração do Pai Nosso, o presidente do Conselho da EKD invoca a bênção aronítica e, logo depois, o Papa concede a bênção na forma trinitária. Concluída a Celebração Ecumênica, Bento XVI encaminha-se para o Seminário de Erfurt, onde, às 13h20 (hora local - 8h20 no horário de Brasília), almoça com os membros do Séquito papal.
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